Já estou em Tulkarm, uma pequena cidade palestina no norte da Cisjordânia. Para chegar aqui tive que tomar um ônibus em Jerusalém Oriental, ir para Rammallah, e de lá tomar uma van, numa viagem que durou cerca de 45 minutos. Chegando aqui, conheci a equipe que iremos suceder (mas substituir vai ser difícil, porque eles são excelentes!), jantamos, dormimos e fomos para a nossa primeira “missão”.
Bem, foi impactante.
Estivemos numa vila nas redondezas, chamada Kafr Qaddum, onde todas as semanas os moradores se manifestam contra a presença de diversos assentamentos judaicos na região (todos os assentamentos judaicos no interior da Palestina são ilegais) e contra as dificuldades de locomoção que isso impõe. Nesse processo, os palestinos se reúnem e saem caminhando por uma estrada que, apesar de ser trajeto óbvio para outra vila, é periodicamente bloqueada pelo exército israelense em razão da presença de um assentamento no local; e, como costuma acontecer, os soldados param estrategicamente em frente à última casa da vila.
E sobre essa casa que eu gostaria de falar. Mais precisamente sobre a família que nela vive, que viemos a conhecer e que acompanheremos ao longo desses meses na Terra Santa (?).
A amendoeira que fica do lado da casa, completamente florida, parece dar um ar um pouco bucólico ao lugar. Mas o bucólico para por aí, porque em toda manifestação que ocorre eles têm o prazer de serem visitados pelos militares israelenses, que, valendo-se do caráter estratégico do lugar, normalmente sobem na sacada da residência para arremessar gás lacrimogênio e outras cositas contra os manifestantes.
Esse fato, aliás, já levou a família a simplesmente deixar de ocupar o segundo e terceiro pisos e passar a viver somente no primeiro pavimento. Portas e janelas, evidentemente insuficientes para impedir o ingresso de soldados, acabam também se revelando inúteis contra os efeitos do gás lacrimogênio, que invade a residência e a deixa com um ar pesado, que parece queimar os olhos. Com isso, toda a família, afora problemas de saúde, vê-se em face de problemas aparentemente bobos: os filhos não podem dormir na sacada durante os meses quentes e o mais velho deles dificilmente conseguirá uma esposa que aceite ir viver próxima aos seus parentes, como dita a tradição, em virtude dos riscos do local.
A família toda parece bem traumatizada, mas, no curso da nossa conversa, já parecia bem mais tranquila com o fato de simplesmente estarmos ali, escutando o que tinham a dizer. A senhora, aliás, parecia completamente resignada: “já nos expulsaram da nossa terra, colocaram um muro, dividiram o nosso território. Que mais eles querem? Tudo é por segurança.” Sim, nesse lugar, a segurança parece justificar coisas espantosas; afinal, como absurdamente comentou um embaixador israelense durante nosso treinamento, em referência aos atentados suicidas (que já não são recorrentes), supostamente, para os árabes, a honra seria mais importante do que a vida, enquanto que para os israelenses a vida seria um bem acima de todos os outros, e por isso, deveria ser protegida a todo custo.
Mas, afinal, vale a pena proteger a vida de um à custa da vida de outro? Qual o preço e as consequências disso? É digno invadir a casa de uma família e matá-la aos poucos, senão fisicamente, pelo menos emocionalmente?
Por enquanto, vou refletindo. Mas o que importa, mesmo, é que ao final da nossa conversa minhas duas companheiras EAs pararam para admirar as flores da amendoeira. A dona da casa cortou três ramos – dois para minhas colegas e outro pro meu colega, que já tem cabelos brancos (eu provavelmente não recebi porque sou homem, jovem e desconhecido – ou porque simplesmente não foram com minha cara :P) - e – sem clichê – os entregou com um sorriso no rosto, já bem mais feliz.
Aí vão as fotos da estrada e das flores:
Oi Érico:
ResponderExcluirFiquei tão contente ao saber da tua aventura pela Palestina. O teu pai me passou um email com o teu blog para eu poder te acompanhar. Tenho certeza que esta será uma experiência que você jamais esquecerá. Vou acompanhar a tua estada por ai, assim vou ficar sabendo mais do realmente se passa na vida dos palestinos. Aproveita bem a tua estada aí mas te cuida, já estou eu falando como uma mãe preocupada ... não repara. Beijos saudosos