12 de abr. de 2012

Sandwich Falafel

Falafel é um bolinho frito feito à base de grão-de-bico. É geralmente servido dentro de um pãozinho árabe, acompanhado de dezenas de temperos, verduras e legumes, como pepino, tomate, rabanete e outras coisas. Para os mais ocidentalizados até batata-frita é uma possibilidade dentro da composição. Cada palestino tem seu falafelman favorito e há uma disputa intensa entre eles para definir quem faz o melhor bolinho gorduroso da Cisjordânia.

No entanto, um cartão postal do lado de lá do muro anuncia, orgulhosamente, que o falafel também é petisco oficial dos israelenses!

 

k582w É e também pode não ser verdade (Photo: Nisim Lev, published by Palphot Ltd)

Admito que fiquei bem surpreso na primeira vez que vi esse cartão postal. Sempre imaginei o falafel como um daqueles produtos que a gente associa com árabes de turbante e camelos no deserto. É como se Marrocos, Egito, Arábia Saudita, enfim, o assim chamado “mundo árabe”, só seguisse existindo à base de falafel, e ninguém mais pudesse “tirar” isso deles. Israel tomando para si a “nacionalidade” do falafel seria o mesmo que a Alemanha dizendo que é o país do samba.

Contudo, depois de algumas unidades de falafel ingeridas em Haifa, Akka e Tel Aviv, me dei conta de que o falafel também é parte da cultura israelense na medida em que muito dessa só existe graças à influência árabe. Afinal, os judeus mizrahim, provenientes do Oriente Médio e do Norte da África, devem ter comido muito falafel antes de emigrarem para o moderno Estado de Israel. Não só na culinária, mas também a música que embala as noitadas israelenses é muito parecida com as melodias tocadas do lado de cá do muro; o hebraico, também, está cheio de expressões árabes; igualmente, fenotípica e estilisticamente falando, não há diferença física óbvia entre um(a) israelense mizrahim e um(a) palestino(a), exceto talvez pelo véu (que nem todas as muçulmanas usam) ou por um pouco mais de pudor na escolha das roupas por parte dos últimos.

Isso me faz pensar em quanto nos auto-engamos ao tentar encontrar estereótipos, especialmente quanto à nacionalidade de alguma coisa. Por algum motivo imaginamos os judeus sempre em oposição aos árabes, e vice-versa. E esse antagonismo é repetido na mídia, nas escolas públicas em Israel e na Palestina, na constituição de colônias exclusivamente judaicas, na proibição de visitas por parte de residentes da Cisjordânia a Israel e na criminalização de visitas de israelenses a zonas definidas como “Área A” pelos acordos de Oslo. Dizer que o falafel é o petisco nacional israelense, assim como dizer que ele é um produto exclusivamente palestino, é só mais uma dessas loucuras desse processo de criação de uma identidade que recusa a existência do outro.

Afinal, Israel parece estar o tempo todo negando a contribuição árabe. Mas, no fim, não consegue escapar dela nem por um segundo. Aquele papo de que é a porta do Ocidente no Oriente, de que há um choque de civilizações, que o Estado está cercado de inimigos árabes, que é a única democracia do Oriente Médio, tudo isso cai por terra quando vemos que Israel bebe da mesma cultura em que os palestinos estão inseridos. Comem falafel, shoarma, gostam das mesmas coisas, não entendem nada de futebol, tem políticos corruptos… daí pra que tanto antagonismo?

DSC02653 Também pode ser ou não verdade (mesmo cartão postal, mas com uma visão alternativa que rola por aí)

 

Óbvio que a Guerra de 1948, que opôs um Estado “judeu” contra diversos Estados “árabes”, foi um evento extremamente traumático. No entanto, passado tanto tempo, ao invés de construir muros e checkpoints, seria melhor explorar essa identidade comum que o Oriente Médio oferece a israelenses e palestinos. Quem sabe seria possível a convivência pacífica entre dois Estados ou mesmo um só Estado sob uma bandeira comum se ambas as partes reconhecessem suas semelhanças e diferenças e se aceitassem mesmo assim. E, como testemunha desse conflito, posso dizer que falta vontade de Israel e sobra fraqueza por parte da Autoridade Palestina para seguir em frente num diálogo construtivo.

Um comentário:

  1. Realmente o ideal seria um só estado sob uma bandeira comum, mas do jeito que as coisas estao vemos que nao é assim que se dará, se conseguissem um Estado pra cada uma, nao seria a melhor soluçao, mas era uma soluçao. no entanto, israel faz de tudo para impedir a consolidaçao de um estado palestino, criando este muro e os assentamentos em terras palestinas, e todas as humilhaçoes pelas quais passam os palestinos, e recebem apoio de potencia norte-americana, que adora usar o discurso de que levam o bem e a democracia para as regioes que vao. sim percebe-se! (ironia).... gostei muito se suas postagens erico parabens!

    carol

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